Como se ouve um poema? O som é tudo, a cadência, o tom, a harmonia... as palavras interessam pouco, como às crianças. Foi assim que me deliciei cedo com as línguas estrangeiras e que sem as entender ainda, tratava de inventar idiomas com as amigas. Quando se ouve um poema na língua materna, também se faz essa regressão mas pode ouvir-se com o espanto com que ouves o alemão? O meu amigo alemão já me prometeu "cantar-me" este poema ao ouvido como se lesse aos seus filhos, eu que em alemão sou ainda mais nova do que os seus rapazes. Fico embevecida com a tua oferta e canto: ", warum bin ich ich, warum nicht du?/warum bin ich hier, warum nicht dort...?" Mas repara que nem todo o poema se assemelha a uma cantilena infantil (que me lembra o terraço em casa da minha "mestra", assim chamada a senhora que nos iniciava na escrita, na leitura e nas contas antes do tempo, no tempo em que não havia tempo..., no tempo em que contar era tão apetecível na folha aos quadrados como a jogar à macaca - lembro-me nitidamente do verde quase alface dos rebordos desse terraço...). Mas, dizia eu, ser que pensa e pondera, que nem todo o poema se apresenta nesse registo de transposição de tempos sem tempo, nesse círculo feliz e luminoso... trechos de dureza, de infeliz resignação ao pensamento formado e reflexivo, de tempos fechados e rectílineos, se interpõem... ainda que quem cante, cante com teimosia que ainda assim é o mundo, como quando eramos crianças. O mundo é o mesmo e nós perdemo-lo ou passamos ao seu lado, afinal à caverna de sombras ANTECEDE o mundo. Queres brincar comigo à rodinha? Anda lá! Temos a tarde inteira, um tempo infinito! Lembras-te? Quando acordavamos e tinhamos a eternidade de UM DIA inteirinho para brincar? Dizia-to eu no outro dia, na cama, que queria tardes inteirinhas para fazer só "uma brincadeira" com a certeza de haver uma eternidade para todas as outras por inventar. Como anulo eu os tempos rectilíneos de permeio é que não sei. Sei muito pouco hoje em dia nos meus dias curtos e inexpressivos de contas forçadas. Adoro-te menino (com ou sem vírgula de permeio).
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